Revista
Científica UDO Agrícola Volumen 10. Número 1. Año 2010. Páginas: 1-6
Morfoanatomia foliar de Brachiaria decumbens Stapf, coletada na
zona rural de Lavras, estado de Minas Gerais, Brasil
Leaf morphoanatomy of Brachiaria decumbens Stapf, collected in
agricultural areas of Lavras, state of Minas Gerais, Brazil
Morfoanatomía
foliar de Brachiaria decumbens Stapf,
colectada en la zona rural de Lavras, estado de Minas Gerais, Brasil
Beatriz A. PEREIRA NICOLAU1,
Thiago Marinho ALVARENGA1, Fernanda FONSECA E SILVA1 e
Flávio José SOARES JÚNIOR1, 2
1Centro Universitário de Lavras, Universidade de Lavras
(UNILAVRAS), Rua Padre José Poggel, 506, CEP: 37200-000,
Lavras, Minas Gerais. Brasil y 2Curador Herbário de Lavras (LUNA), Rua
Padre Arnaldo Jansen, 537, apartamento 201, Cx Postal: 32-8813-7675, Santos
Anjos, Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
E-mails: fjsoaresjunior@yahoo.com.br y
fjsoaresjunior@gmail.com Autor para
correspondência
Recebido:
11/04/2010 |
Fim
da arbitragem: 26/08/2010 |
Revisão recebida: 07/11/2010 |
Aceito: 09/11/2010 |
RESUMO
A
Brachiaria é o gênero de pastagem mais cultivado no território
brasileiro, sendo usado de diversas formas na criação de animais e de maneira
bem eficiente. Sua importância econômica e ecológica motivou o presente estudo que
teve como objetivo descrever a morfoanatomia foliar da Brachiaria decumbens Stapf. Para tal foram feitos cortes
transversais e paradérmicos na região mediana da lâmina foliar, sendo os
mesmos, submetidos à descoloração em hipoclorito de sódio comercial e corados
com Safranina e Azul de Astra. Verificou-se que a espécie em questão apresenta
feixes vasculares de diferentes calibres, organizados
por todo o mesofilo. Apêndices epidérmicos como tricomas, possivelmente agentes
de proteção, e a sinuosidade das células epidérmicas foram identificados como
auxiliares da adaptação mecânica a entrada e saída de água.
Palavras chave: Histologia, anatomia foliar, pastagem, gramíneas.
ABSTRACT
The Brachiaria grass is the most cultivated in Brazil, efficiently
used in several kinds of cattle breeding. It’s ecological and economic
importance stimulate this work that aim to study the leaf morphoanatomy of Brachiaria
decumbens Stapf. Cross and
paradermal sections cuts were made in the region of the median leaf and, after
that, they were submitted to discoloration in commercial sodium hypochlorite
and colored with Safranin and Astra Blue. We found that this specie has
vascular bundles of different sizes, organized
throughout the mesophyll. Epidermal structures like trichomes, possibly
protection agents and the sinuosity of their cells were identified as an
auxiliary mechanical adaptation of the water flow.
Key words:
Leaf anatomy, histology, pasture,
grass.
RESUMEN
Brachiaria
es el género de pasto más cultivado en el territorio brasileño, siendo usado de
diversas formas y de manera muy eficiente en la cría de animals. Su importancia
económica y ecológica motivó el presente estudio que tuvo como objetivo
describir la morfoanatomía foliar de Brachiaria decumbens Stapf. Para esto se hicieron cortes transversales y
paradérmicos en la región mediana de la lámina foliar, siendo los mismos
sometidos a decoloración en hipoclorito de sodio comercial y coloreados con
Safranina y Azul de Astra. Se verificó que la espécie
presenta haces vasculares de diferentes tamaños, organizados
a través del mesofilo, apéndices epidérmicos como tricomas, posiblemente
agentes de protección y sinuosidad de células epidérmicas se identificaron como
auxiliares de la adaptación mecánica a la entrada y salida de agua.
Palabras clave: Anatomía foliar, histología, pastos, gramíneas.
INTRODUÇÃO
O gênero Brachiaria (Trininus)
Grisebach, pertencente a família botânica Poaceae ou Gramineae, é o mais cultivado em áreas de pastagens no Brasil,
sendo intensamente usado na cria, recria e engorda dos animais. O seu sucesso
na produtividade pecuarista é consequência do manejo adequado. O grande
interesse dos pecuaristas pelas espécies de Braquiárias se prende ao fato
destas espécies serem plantas com alta produção de matéria seca, por possuírem
boa adaptabilidade, facilidade de estabelecimento, persistência e bom valor
nutritivo; além de se apresentarem resistentes às doenças e satisfatório
crescimento durante a maior parte do ano, inclusive no período seco (Costa et al.,
2005).
A Brachiaria decumbens
Stapf foi trazida da África e introduzida no Brasil pelo Instituto de
Agropecuária do Norte (IPEAN) em 1952 sob o nome Brachiaria
brizantha Stap. Em 1965, o
material da mesma espécie foi adquirido do Suriname, desta vez como B. decumbens. Ambos os materiais
introduzidos pertenciam a espécie B
decumbens, tratando-se de materiais distintos de B. bryzantha, que também foi introduzida em 1965
(Milles et al., 1998). Logo nos primeiros
instantes, o propósito da introdução foi alcançado e o mesmo, bem sucedido. Com
isso a pecuária no centro-oeste cresceu e dominou as demais regiões do Brasil.
Sua dispersão ocorreu rapidamente, parte por ação do homem, que expandiu suas
áreas de plantio com esta pastagem, e parte por agentes naturais de dispersão,
incluindo anemofilia e zoofilia. O gênero Brachiaria
é típico do estádio clímax das pradarias na África e impõe uma série de formas
de interferência sobre o crescimento de plantas de porte arbóreo e arbustivo.
Assim, hoje, as espécies de Brachiaria
constituem as principais plantas invasoras das culturas florestais e de pomares
de fruteiras tropicais e sub-tropicais; além de constituírem um importante
fator de redução da biodiversidade em reservas de formações vegetais naturais
(Pitelli e Pavani, 2005).
Devido
à grande importância econômica e ecológica de Brachiaria decumbens, tanto
na pecuária, agricultura e sistemas naturais (Toledo et al., 1999), estudos como este, com o qual se propõe subsidiar
futuros esforços em manejar a cultura desta espécie, bem como de espécies
afins, em ambientes naturais não controlados, são de suma importância.
Portanto, foi o objetivo principal neste estudo, detalhar as estruturas
histológicas e anatômicas das folhas de Brachiaria
decumbens Stapf coletadas em uma área de influência do Cerrado mineiro,
comparando os resultados encontrados com os descritos em literatura para este
grupo vegetal.
MATERIAIS E MÉTODOS
A espécie estudada
O
gênero Brachiaria, cujo nome faz uma
alusão aos seus racemos armados, é uma gramínea perene ou anual; ereta ou decumbente; entouceirada,
rizomatosa, com enraizamento nos nós inferiores em contato com o solo, denso
pubescente, de coloração geralmente verde-escura, de 30 a 90 centímetros de
altura. Suas espiguetas são solitárias, raramente aos pares, subsésseis,
organizadas em duas linhas; as lemas férteis possuem arestas reduzidas e
tombadas (Hitchcock, 1935; Lorenzi, 2000).
A morfologia de Brachiaria decumbens é bem variável, mesmo entre as suas variedades
cultivadas. A, aqui estudada, introduzida em Belém, via Estados Unidos, uma
planta decumbente ou rasteira com 30 a 60 centímetros de altura, radicante nos
nós em contato com o solo, de folhas macias e felpudas, com escassa produção de
sementes. Já a variedade introduzida em São Paulo, via Austrália, apresenta-se
como uma planta com cerca de 1 metro de altura, mais ereta, pouco radicante a
partir de nós; rizomas muito curtos, contidos nas touceiras; folhas rígidas e
esparsamente pilosas; com grande produção de sementes (Lorenzi, 2000).
Em geral, os colmos de B. decumbens são geniculados, ramificados, hirtusos ou glabros, sendo os nós sempre glabros e de coloração mais escura. Entrenós inferiores curtos e entrenós superiores mais longos. No sistema basal ocorrem dois tipos de rizomas (1) curtos, duros e nodosos e (2) alongados, também duros, de tipo estolonífero. As raízes são filamentosas. As folhas são em bainhas estriadas, mais compridas que os entrenós, envolvendo completamente o colmo. Possui lígulas em forma de densa cortina de cílios com cerca de 1 mm de altura. As lâminas são lanceoladas ou linear-lanceoladas, de base arredondada e ápice acuminado, com até 18 cm de comprimento por 1,5 cm de largura; hirtusas em ambas as faces; margens espessas, finamente crenuladas em certos trechos. A planta é bastante enfolhada. Na parte terminal dos colmos surgem panículas racemosas com 2 a 5 racemos distanciados entre si, que se dispõe de forma ascendente. O eixo das panículas estende-se um pouco além do último racemo. Podem ocorrer finos dentículos e alguns pêlos, especialmente junto à base dos racemos, que apresentam de 2 - 12 cm de comprimento, com duas fileiras de espiguetas que se sobrepõem levemente, de um lado da raque, que é achatada e ciliada nas margens. Possuem pedicelos com ápice discóide. (Lorenzi, 2000).
Metodologia aplicada
Amostras de três
plantas de
Brachiaria decumbens foram coletadas em
Junho de 2008, na região do sítio Late Cachorro, município de Lavras, sul do
estado de Minas Gerais. Cinco folhas adultas foram retiradas, a uma
altura intermediária de cada planta, e fixadas em solução de Formol-Ácido
Acético-Álcool (FAA) a 70% (Johansen, 1940), por 24 horas; sendo transferidas
em seguida para uma solução de álcool a 70%. A amostra composta de três
indivíduos foi guardada no Herbário de Lavras – H. LUNA, do Centro
Universitário de Lavras – UNILAVRAS, até o momento da realização dos cortes.
Os cortes foram feitos a mão livre, por meio de uma
lâmina de aço, sempre na região mediana das folhas. Cada corte foi imerso em
uma solução de Hipoclorito de Sódio comercial até a sua total descoloração,
sendo imediatamente lavados em álcool e água destilada. Por fim, as secções
passaram por uma seqüência de corantes, Azul de Astra (1%) e Safranina (1%), (Johansen,
1940) e a partir de então, vieram a compor lâminas
semi-permanentes, que foram descritas e fotografadas em microscópico óptico. Os
resultados encontrados, meramente descritivos, foram discutidos e comparados à
estudos similares feitos com plantas afins.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os cortes
paradérmicos da face abaxial das folhas amostradas de Brachiaria decumbens evidenciaram células epidérmicas com paredes
sinuosas (Figura 1A). Segundo Ferreira et
al. (2007), a ocorrência destas sinuosidades nas paredes celulares de
células da epiderme decorre da adaptação mecânica destas aos movimentos de expansão e contração das folhas
durante os processos de entrada e saída de água. Scatena
e Segecin (2005) complementam esta afirmação sugerindo que a sinuosidade
parietal pode estar envolvida na proteção contra o murchamento, evitando o
colapso das células. Uma condição condizente com o metabolismo das heliófitas.
Nos cortes tangenciais foram ainda
observados complexos estomáticos do tipo paracítico (Esau, 1974) (Figura 1A), posicionados
ao mesmo nível das demais células epidérmicas, em fileiras paralelas as
nervuras centrais. Estes complexos estomáticos formados por células guardas,
estreitas na região mediana e alargados nas extremidades, criando um aspecto de
halteres (Esau, 1974; Fahn, 1978), têm sua ocorrência tanto na face adaxial
quanto na face abaxial das folhas, assegurando a classificação destas como
anfiestomáticas. A Câmara subestomática é reduzida, sendo delimitadas por duas
células parenquimáticas alongadas e estreitas (Figura 1B).
Os cortes transversais das folhas
mostraram uma epiderme unisseriada com apêndices do tipo tricomas simples,
unicelulares, tectores (Figura 2A), e cutículas regularmente distribuídas e
finas, em ambas as epidermes, abaxial e adaxial. Na epiderme adaxial foram
encontradas células buliformes, intensamente delimitadas por células do
esclerênquima que se estendem por entre os feixes vasculares (Figura 2B). Essas
células buliformes estão relacionadas com o enrolamento da folha e com a adaptação
desta à deficiência hídrica, e são caracteristicamente maiores que as células
epidérmicas típicas (Mauseth, 1988; Fahn, 1990).
Sobre os tricomas e a forma da cutícula
encontrada nesta investigação, Aoyama e Mazzoni-Viveiros (2006) mencionam que
os tricomas não glandulares são componentes antagônicos à transpiração
excessiva da planta, que juntamente com a cutícula, contribuem com a redução na
perda de água deste grupo de organismos (Johnson e Brown, 1973). Assim, apesar
de a cutícula apresentar-se fina em B.
decumbens, uma condição freqüentemente atribuída às folhas submersas ou às
partes submersas de folhas flutuantes de plantas hidrófilas
(Appezzatto-da-Glória e Carmello-Guerreiro, 2006), sua função fisiológica é
reforçada nesta espécie pela presença dos tricomas.
Na nervura principal e de maior
calibre (Figura 3A), o feixe vascular, com xilema próximo à face adaxial e
oposto ao floema, está massivamente guarnecido por células esclerenquimáticas
na sua face abaxial. Os feixes vasculares, do tipo colateral fechado, podem ser
do tipo poligonal ou anguloso (Metcalfe, 1960), e estão envoltos por uma bainha
esclerenquimática da mesma forma, como descrito por Hayward (1953) e Esau
(1974). Entre as diferentes nervuras da folha é perceptível uma redução do
tamanho dos feixes à medida que se dispõem mais próximos das bordas. Esta
variação de tamanho já havia sido relatada por Alves de Brito e Rodella (2002)
para o xilema de gramíneas, onde o referido autor descreveu três tamanhos
distintos possíveis para feixes xilemáticos: pequeno, médio e grande porte.
O parênquima clorofiliano apresenta
disposição radiada em torno dos feixes vasculares, envolvendo completamente
aqueles de menor calibre (Figura 3B), localizados no centro do mesofilo. Nos
feixes de maior calibre, esse tecido envolve apenas a metade do feixe, sendo
interrompido pela bainha esclerenquimática.
A exemplo do que foi proposto por
Appezzatto-da-Glória e Carmello-Guerreiro (2006), em que as gramíneas
tropicais, por apresentarem via fotossintética do tipo C4, possuem
em geral, células do mesofilo dispostas de maneira radiada em torno da
endoderme formando uma coroa; as células do parênquima clorofiliano dos cortes
analisados dispunham-se radialmente ao redor dos feixes (Figura 4). Internamente,
essa coroa de células do mesófilo encontra-se com a bainha parenquimática do
feixe vascular. Bainha esta que, segundo Esau (1965), é uma endoderme simples,
ou seja, apresenta apenas uma camada de células, como descrito por Metcalfe
(1960) e Alves de Brito e Rodella (2002) para o gênero Brachiaria.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Definitivamente,
as gramíneas constituem uma família botânica amplamente investigada quanto a
sua fisiologia, morfologia e relações ecológicas. Entretanto, esta é uma
condição que não inviabiliza novas investigações que visem contribuir para o
maior conhecimento sobre este grupo. Principalmente, visto a alta diversidade
de forma e de táxons existente dentro das Poaceae; bem como, na íntima relação
de alguns de seus gêneros mais conhecidos com a produtividade econômica deste
país.
A
descrição das secções foliares, o principal órgão aéreo da espécie estudada,
amparadas por resultados similares obtidos com sub-famílias e gêneros afins,
permitiram concluir que a planta em questão não apresenta muitas
características anatômicas relacionadas ao ambiente mesofítico; sendo a sua
fisiologia, no entanto, totalmente adaptada a sobrevivência nesses ambientes.
Ainda assim, algumas estruturas anatômicas tais como as sinuosidades entre as
células epidérmicas, que aumentam a compactação do tecido de revestimento; os
tricomas e as cutículas; coletivamente, asseguram o sucesso das populações de Brachiaria decumbens diante da seca e da
herbivoria.
Por
fim, mesmo que muitas das características morfo-anatômicas aqui relatadas sejam
comuns a alguns, senão todos os representantes das Poaceae; deve-se ter cautela
na extrapolação desses resultados para táxons afins, pela já discutida
diversidade morfológica intrínseca a esta família.
LITERATURA CITADA
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